A humanidade se esqueceu de suas origens cósmicas
No mundo moderno, segregação é a regra. Desde a adoção do cartesianismo como solução para tudo, até os paradoxos da condição humana, temos perdido, como humanidade, a conexão com nossa natureza primordial. E este desencanto o homem refletiu na natureza que o cercava. Se antes esta era sua mãe, ela passa então a corporificar o selvagem perigoso; um objeto para sobrepujar e dominar.
O desencanto gerado por tal perspectiva é evidenciado na degeneração exponencial pela qual passa a vida no planeta, gerando consequências igualmente nocivas à humanidade. Suponho que por isso o animismo tenha ganhado força ultimamente, ou seja, a ideia de que tudo o que existe tem alma e, de uma certa maneira, está vivo.
É no animismo também que encontramos a explicação lógica pela qual magia e Astrologia funcionam, pois postula também que as almas dos seres são conectadas à anima mundi, a alma do mundo da qual a matéria é corporificação. Assim, eu, uma rosa e Vênus temos todas algo em comum, algo que nos permite influenciar uma à outra. E é por isso que eu sou capaz de usar pétalas de rosa na hora de Vênus para fazer um ritual de beleza e atração.
A Linguagem do Céu e da Terra: a Astrologia
Eu passei anos da minha vida tentando entender a Astrologia. É uma obsessão que eu carrego desde criança. Eu sempre amei olhar para o céu e toda vez que o fazia, me sentia por ele provocada, como se o firmamento estivesse repleto de lendas de criação e destruição prontas para serem compartilhadas comigo - se eu ao menos soubesse sua língua.
Eu também sempre fui interessada no poder do mito e do arquétipo. Mitologia Grega era meu apelido na escola (história real). O ocultismo, no geral, tem sido uma fonte eterna de fascinação para mim - e quanto mais sombrio, mais legal. E foi na Astrologia, como numa perfeita trança helicoidal, que eu encontrei a combinação destas minhas obsessões.
E quando eu fico obcecada, eu preciso saber. Tudo. Eu devorei livros, passei horas em fóruns (olá, lindagoodman.com), estudei o meu mapa, os mapas de amigos, os mapas de pessoas famosas. E depois de anos fazendo isso, eu me sentia mais perdida do que nunca. Como entender um mapa? De fato, devido a certas inovações tecnológicas recentes, que te permitem obter delineações sem se consultar com um astrólogo, eu cheguei a pensar que a delineação de um mapa natal era um processo algorítmico, tal planeta está em tal signo, em tal casa, em tal aspecto com tais e tais planetas.
Mas e daí? O que fazer com isso? Como extrair disso uma narrativa coesa e relevante para o dono do mapa? Eis aí, eu pensava, o real trabalho do astrólogo, aquilo que separa um relatório gerado em site de uma consulta com uma pessoa humana. (Não me leve a mal, eu amo essas delineações automáticas e elas já me ajudaram muito a entender a mim e a minha vida, só não à Astrologia.)
Consultas com astrólogos não me foram muito úteis desta perspectiva. Eu sempre saía da sessão com a impressão de ter sido mais uma tela onde o profissional projetou suas preferências e neuroses do que uma consulente que, ao conversar com o Oráculo dos Deuses, saiu com algo de útil da sessão.
As coisas começaram a mudar para mim quando conheci a Astrologia Clássica, acho que, acima de tudo, porque ela realmente explicita as relações entre os elementos dos mapas. Para mim, um mapa deixou de ser um amontoado amorfo de planetas em signos e casas com aspectos. Estes mesmos elementos passaram a representar coisas, i.e., o regente da seis representa seu pet e tudo o que acontece com ele por trânsito, progressão e etc. se reflete no seu pet e no seu relacionamento com ele.
Aí a luzinha começou a acender na minha cabeça. Mas eu ainda não ouvia a famigerada música das esferas. Ainda assim, continuei estudando, em especial Astrologia eletiva e horária - ramos dos quais eu jamais ouvira falar enquanto estudante da Astrologia moderna. Sair da delineação natal apenas realmente ajuda a expandir a compreensão do astrólogo e se alguém viesse me perguntar por onde começar, eu responderia sem piscar: pelo livro do John Frawley de Astrologia Horária.
Astrologia e Animismo: o Espírito das coisas
O que eu entendi com tudo isso sobre como a Astrologia funciona é: os arquétipos habitam o Mundo Ideal de Platão. A cadeira arquetípica, o amor arquetípico e o seu eu arquetípico: todos eles lá existem e descendem do fogo pelo ar e pela água através das esferas planetárias para aterrissar na terra e compor a corporificação de uma cadeira, do amor ou de você. Neste processo, eles vão incorporando as influências planetárias, de maneira e proporção correspondentes à sua natureza arquetípica.
Os planetas são a corporificação de certos arquétipos - na Antiguidade, astrólogos como Vettius Valens se referiam, por exemplo, ao planeta Marte como “a estrela de Marte”. Os corpos dos astros não influenciam os eventos terrenos diretamente, como muitos céticos dizem ser para desacreditar a Astrologia. Eles são como os ponteiros de um relógio. Se a influência vem de algum lugar, é do Mundo Ideal. E se os planetas agem como ponteiros, é porque se conectam, assim como nós, à Alma Cósmica que é Mãe de todas as coisas.
Da Magia ao Contato Imediato de Terceiro Grau
Paralelamente a estes estudos, eu estava descobrindo como fazer Magia - porque usar as leis ocultas da natureza para alterar sua realidade é simplesmente irresistível. E também porque o mundo é cão demais pra viver sem nem um banimentozinho (eu não sei como as pessoas fazem, sério).
Mas o ponto é que, no meio de uma miríade de sistemas e maneiras de efetivamente operar a magia, eu naturalmente gravitei para a Magia Planetária - pun intended. Acho que porque era um complemento lógico à base de Tarot e Cabala que trago da adolescência (tenho o enorme privilégio de ser magista de segunda geração). Simplesmente fazia sentido pra mim.
Maravilhada com a inquestionável lógica de peticionar a esfera que corresponde ao seu objetivo mágico, eu comecei a brincar de usar dia e hora planetários, vela da cor correspondente ao planeta, fase da Lua adequada à natureza do ritual. Eu me diverti tanto. E eu tinha resultados. Eu inclusive suspeito que foi algum feitiço que eu lancei nesta época que me levou àquilo que me fez, finalmente, ouvir a música das esferas: Magia Talismânica.
Fazia um tempo que eu via essa coisa bombar na gringa, óleos e velas e até joias feitas sob uma eletiva auspiciosa. Morria de vontade mas não sabia como fazer, até que alguém um dia falou no feed do meu Twitter: o livro de magia planetária do Warnock tá em promoção. Oi??? Como assim? Existiam livros, gentil leitor!!! E foi assim que eu comecei a fazer, pelo menos a princípio, talismãs de papel e óleos.
Eu nunca vou me esquecer do primeiro talismã que eu fiz: um de Deneb Algedi, numa manhã de sábado. Eu preparei tudo antes: os quadrados de papel-cartão pretos, a caneta-gel prata, o importantíssimo incenso e uma vela. Na hora eleita por mim, eu desenhei o sigilo e escrevi o nome da estrela fixa nos pedaços de papel-cartão. Foi na hora de passar o papel pelo incenso, lendo do celular mesmo a invocação sugerida no livro do Warnock, que bateu.
Eu senti a energia de Deneb Algedi descer com força no meu timo e tive o que imagino ser o oposto da sensação de encarar o abismo e por ele ser encarada de volta. Que palavras descrevem o quão assombroso é estar diretamente sob o feixe, os olhos, de um Daimon estelar? Minha voz embargou e falhou. Tive que parar a invocação para chorar! Eram lágrimas de alegria.
Assim mesmo, com choro e tudo, os talismãs deram efeito rápido. Diz-se de Deneb Algedi, a cauda do Capricórnio, que seus talismãs promovem prosperidade e melhoram a casa que os abriga. Pois bem, entrou dinheiro inesperado e uma parte eu usei pra comprar coisas pra casa que eu estava querendo e achei na promoção. Por isso, rapidamente me convenci de que talismãs são uma forma elevada de tecnologia mágica.
Eu confesso, todavia, para qualquer um que perguntar: sou viciada em fazer talismãs porque o ritual te coloca num headspace tão divinal. Te dá a chance de sentir no corpo as correntes energéticas do astro invocado. Mas os resultados são legais e tudo.
A Música das Esferas Celestes
E foi procurando elevar minha capacidade de fazer bons talismãs que eu comecei a ler o Picatrix. É um compilado de textos mágicos do século XI que inclui tanto informações preciosíssimas sobre talismãs - na verdade, deve ser o texto mais antigo sobre isso que temos no Ocidente - quanto receitas bizarríssimas envolvendo secreções e partes animais que colocariam qualquer bruxa má hollywoodiana no chinelo.
De uma maneira ou de outra, é um livro mágico, um desses livros que só de ler sua consciência se transforma (esses são raros mas incríveis). E foi alguma coisa nesse livro, eu nem sei ao certo o que, que me fez ver como os astros são dotados de Consciência e Vontade. Eu pensei no meu mapa, nas eletivas de talismãs que achei meio sem querer, nas horárias que eu fiz. Eu pensei em todos os mapas que eu já vi na vida.
E, conforme desceu sobre mim a compreensão, dentro do meu Coração dos Corações, de que cada um desses mapas foi lançado não pela mão de um acaso frio e distante, mas pela Vontade de uma Inteligência Cósmica que se importa intimamente com cada coisa que existe, eu eu a ouvi. A Música Das Esferas.
Olhe para o seu mapa. Pense no minuto em que você nasceu. Agora imagine que todo o Universo conspirou para que você nascesse exatamente onde e quando você nasceu, por um motivo, com um propósito. Como é isso?
A sua carta natal nada mais é do que a eletiva que seu Daimon escolheu para fazer seu mais precioso talismã: Você.
Eu amo seus textos no geral, mas este me deixou impactada. Primeiro pela sua descrição do que sentiu ao fazer o talismã de Deneb Algedi. Imagino o quão intenso deve ter sido! Como que para dizer que você tinha encontrado sua missão, né? Agora, este trecho: "A sua carta natal nada mais é do que a eletiva que seu Daimon escolheu para fazer seu mais precioso talismã: Você". Isso foi de arrepiar. Na verdade explodiu minha mente aqui. Eu me lembrei de você dizendo que somos como "avatares", como representações materializadas de nossos Daimons, e agora imaginei minha Daimon fazendo uma eletiva pro meu nascimento, rs. Os aspectos e posicionamentos refletindo as vivências, os desafios, as tendências, o temperamento. Acho que…